Adoção de medidas protecionistas afetarão as exportações; os EUA são o segundo maior comprador da produção de MS
A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos definida ontem vai impactar a economia de Mato Grosso do Sul. Conforme especialistas consultados pelo Correio do Estado, a nova oportunidade conferida ao mandatário para comandar a potência econômica mundial deve refletir em todo o mundo e impactar tanto positiva quanto negativamente o Estado.
O principal ponto destacado pelos analistas econômicos é o plano de Trump para adotar medidas protecionistas no país norte-americano, que deve afetar de formas distintas os preços e as negociações das commodities. Entre os analistas, existe uma leitura de que as políticas propostas pelo republicano devem deixar o dólar e os juros mais altos.
Para o doutor em Administração Leandro Tortosa, é preciso atenção às estratégias que serão implementadas, porque Trump tem inclinação por fazer a América “great again” (grande de novo) como fez em sua primeira passagem.
“Aumentar medidas protecionistas e sobretudo daqueles produtos que ele entende que ameaçam a economia dos Estados Unidos. Ele já sinalizou isso para os carros elétricos, principalmente os carros chineses, mas nada impede que ele faça a mesma coisa com produtos que incomodam por serem mais competitivos, como a laranja brasileira, a soja, a carne e o aço brasileiros, por exemplo, commodities que nós [Mato Grosso do Sul] somos grandes produtores e podem sofrer uma barreira de entrada nos Estados Unidos”, diz.
O mestre em Economia Lucas Mikael corrobora com a análise e complementa que ao aumentar as tarifas de importação, com sobretaxas de até 20%, o Brasil pode perder a competitividade das exportações.
“Incluindo as de MS, que dependem de produtos como soja, carne bovina e milho. O aumento das tarifas pode reduzir a demanda dos Estados Unidos por esses produtos, impactando diretamente os produtores do Estado, além de gerar um efeito inflacionário que fortalece o dólar, tornando os produtos brasileiros mais caros e diminuindo a competitividade”, ressalta.
A possível desaceleração econômica nos EUA, como resultado das tarifas e da política de deportação de imigrantes, pode reduzir a demanda global por commodities, afetando os preços no mercado.
“Para MS, que é um grande exportador de soja e carne, essa redução de preços pode prejudicar os ganhos dos produtores locais. A queda na demanda por commodities pode ser ainda mais acentuada se a guerra comercial entre os EUA e a China diminuir a procura por produtos como a soja, o que reduziria a receita de exportação do Estado”, completa Mikael.
Atualmente, os Estados Unidos são o segundo maior comprador da produção de Mato Grosso do Sul, atrás apenas da China. Conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), de janeiro a outubro, os envios de MS aos EUA resultaram em US$ 524,930 milhões negociados, alta de 26,30% ante os US$ 415,605 milhões negociados no mesmo período do ano passado.
Por outro lado, o mestre em Economia Eugênio Pavão ressalta que na primeira passagem do republicano, a relação econômica com MS não sofreu descontinuidade.
“Porém, como esse mandato não tem um padrão definido, a expectativa seja de manutenção dos negócios, mas caso ocorra algo fora do padrão, estaremos dependente da geopolítica para equilibrar. Por exemplo, alta exagerada do dólar, provocada por altas dos juros, dificultando as importações, fuga de dólares e aumento da inflação. Em suma, Trump 2 poderá ser um governo voltado para dentro, muito mais do que foi o Trump 1, essa é a incógnita”, analisa.
POSITIVA
Ainda no caso do protecionismo de Trump, é possível que tanto Mato Grosso do Sul quanto o Brasil como um todo sejam beneficiados. A guerra comercial com a China, por exemplo, pode abrir espaço para o Brasil aumentar suas exportações de soja para o mercado chinês.
“A China pode reduzir as compras de soja dos EUA, por conta das tarifas. Esse deslocamento de demanda pode beneficiar produtores de MS,
mas é importante ressaltar que a redução dos preços das commodities em nível global pode atenuar os ganhos”, enfatiza Mikael.
O doutor em Economia Michel Constantino avalia que há uma boa expectativa com a eleição americana.
“Com isso, a tendência é melhorar o mercado para o agronegócio brasileiro, na venda de commodities, energia e aço, pois ele deve taxar cada vez mais os chineses, fazendo que nossos produtos tenham maior valorização para a Ásia. Mas é preciso esperar a forma e o como ele vai agir nos negócios internacionais”.
Tortosa ainda corrobora que a alta do dólar impacta de forma contraditória a economia de Mato Grosso do Sul. Em um primeiro momento, fica mais interessante para o exportador.
“Com o dólar mais caro, ele recebe mais reais para cada dólar exportado. Por outro lado, com o dólar mais caro, a gente precisa importar maquinário e vai importar mais caro. O Brasil tem um problema na produção de maquinário, a gente não é muito intensivo em tecnologia. Mas não somente máquinas, todos os outros insumos que a gente vai importar. Então, combustível, por exemplo, e outros produtos que têm cotação no mercado internacional, como a soja, o milho, a carne bovina, todos eles podem sofrer um impacto, por conta de um dólar futuramente mais caro”, detalha.
Os economistas ainda frisam que é importante ressaltar que as análises são feitas baseadas naquilo que já foi visto, na primeira passagem de Trump pela Casa Branca e nas propostas de governo atuais dele.
“Então, a gente não sabe, tem que esperar pra ver o que pode acontecer. Mas eu não consigo ver um benefício a longo prazo se ele implementar plenamente o governo dele ou a proposta de governo dele”, conclui Tortosa.
Ao Estadão, o pesquisador do FGV/Ibre Armando Castelar reforçou que o cenário externo pressiona ainda mais o governo federal a colocar de pé a agenda de corte de gastos para melhorar a saúde das contas públicas.
- fonte: Correio do Estado