Reconhecida pela ciência como única espécie de réptil exclusiva do Pantanal, a cobra d’água (Helicops boitata) sumiu do mapa. Estudo publicado este mês na revista “Biodiversidade Brasileira” constatou o desaparecimento da espécie que só existe no bioma depois dos incêndios que devastaram a planície alagada, entre 2020 e 2023. Agora, o animal corre o risco de ser declarado como ameaçado de extinção.
De acordo com o artigo científico, os pesquisadores localizaram apenas exemplares mortos de cobra d’água horas após episódios de queimadas. Contudo, encerrado o período da ocorrência de fogo, os estudiosos não encontraram mais nenhum exemplar da espécie, vivo ou queimado.
O levantamento foi realizado no Pantanal dos municípios de Poconé e Barão de Melgaço, em Mato Grosso, entre os anos de 2020 e 2023. Ao todo, os cientistas contabilizaram 1707 registros de 45 espécies, em expedições feitas com e sem a ocorrência de incêndios.
Cobra d’água vive em ambiente extremamente vulnerável
Durante as expedições de emergência, realizadas até 72 horas após o fogo ser apagado, as serpentes abrangeram o maior número de indivíduos mortos entre os répteis. Além disso, nove espécies foram registradas exclusivamente na emergência, sendo quatro lagartos e cinco serpentes, incluindo a Helicops boitata.
Segundo os pesquisadores, as carcaças das cobras d’água costumavam ser encontradas em grupos. “O que chama a atenção é que até esse monitoramento, poucos exemplares dessa espécie tinham sido encontrados. O que vemos agora é que ela ocorre em um ambiente de difícil acesso e que esse ambiente está extremamente vulnerável“, destaca o biólogo Leonardo Felipe Bairos Moreira, pesquisador do INPP e um dos autores do artigo, à Agência Bori.
O fato da cobra d’água ser uma espécie que precisa de corpos d’água para sobreviver e utiliza fendas no solo para se abrigar em períodos de seca dificulta seu monitoramento e potencializa sua vulnerabilidade diante do fogo.
Risco de extinção
Depois da pesquisa, que não mais localizou cobras d’água vivas ou mortas após os incêndios, a serpente foi avaliada como ameaçada de extinção, segundo os critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), e deve aparecer já na próxima versão da Lista Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção
Pós-doutorando do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade Animal na UFG e principal autor do artigo, Alejandro Valencia-Zuleta, declara à Agência Bori que os métodos atuais ainda não conseguem avaliar com precisão os impactos do fogo e da seca sobre a biodiversidade de répteis e anfíbios no Pantanal.
Ele alerta que outras espécies, possivelmente desconhecidas e endêmicas, podem estar gravemente ameaçadas. “Não encontramos tantos anfíbios quanto o esperado, mas isso não significa que não estejam morrendo; podem ter sido carbonizados, predados ou estarem muito bem escondidos”, explica.
A cobra d’água recebeu o nome científico de Helicops boitata em homenagem à serpente folclórica que protege as florestas contra incêndios causados pelo homem. O artigo científico que divulgou a ameaça de extinção à espécie foi escrito por pesquisadores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), da Universidade Federal de Goiás (UFG) e do Instituto Nacional de Pesquisa do Pantanal (INPP).
- Fonte: Jornal MidiaMax