Por Reuel Oliveira
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Os estudantes universitários convivem diariamente com o cansaço mental e corporal, devido a grande quantidade de conteúdo recebido nas aulas. Além das informações, os estudantes lidam com cobranças familiares, incertezas pessoais e sociais e a constante avaliação institucional. Com a junção de todos esses fatores, os jovens, muitas das vezes, têm a sua saúde mental afetada, o que atinge cada um de uma maneira diferente. Nos casos mais graves, os estudantes em rota de fuga podem desenvolver problemas, transtornos e chegar até mesmo ao suicídio.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicidio de jovens entre 15 e 29 anos é a quarta maior causa de mortes na faixa etária, e o Brasil é o líder em suicídios destes jovens na América Latina. Com o agravante da pandemia, os dados seguem em crescimento.
Para Tiago Ravanello, pós-doutor em psicologia clínica e professor da UFMS – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, os índices de sintomas depressivos de ansiedade, automutilações e outros, são de fato maiores em estudantes universitários, e não por acaso. O mundo das faculdades influencia de muitas maneiras a vida do estudante, seja por meio da carga horária, de uma possível mudança de cidade ou das avaliações. Segundo Ravanello, todas as situações às quais o aluno é exposto afetam sua saúde mental.
“Existem questões que levam ao sofrimento psíquico que tem a ver com a precariedade da moradia e organização de vida, que vão, por exemplo, dos horários de sono, horários de descanso e horários de entrada e saída da universidade. Então muitos dos estudantes estão vivendo também experiências de vida muito precárias e em que não há condições de descanso, de sono, de alimentação e de garantias de dignidade humana, porque esse processo de formação ele costumeiramente nos leva a formas de extrapolação dos nossos limites e de desrespeito às condições de uma vida saudável”, disse o professor.
A exposição a condições de vida longe do ideal, afetam o estudante e não estão só no que se diz respeito a prejudicar a saúde mental. Além das situações de cansaço extremo, má alimentação e cobranças constantes, está o processo de transformação e amadurecimento natural que é vivido no período em que se está na faculdade.
As universidades, sejam públicas ou privadas, não são o sonho das pessoas, mas sim uma ponte que se usa para alcançar tal lugar. Ou seja, as instituições de ensino superior têm a função de preparar o cidadão para exercer a profissão desejada, mas que o aluno ainda não conquistou. No processo dos estudos, as pessoas passam por uma mudança de identidade, uma transição do que se é, para aquilo que almeja ser, e esse processo pode afetar de maneira negativa o universitário.
“A formação cobra do aluno uma transformação, e a transformação é tornar-se algo diferente. Só que esse processo de deixar de ser quem se era, para se tornar alguém que ainda não se é, cobra um preço muito alto, que é abandonar certas crenças, laços e em algumas vezes até a vida que se tinha. Tudo isso enquanto tem que atender demandas irreais. Então a vida na universidade faz exigências muitas vezes injustas, e sustentar essa divisão entre perder-se e reencontrar-se, é algo que questiona muito a saúde mental” explicou o Psicólogo.
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A realidade da vida universitária, também chega até aqueles estudantes que buscam a aprovação, e dividem seu tempo em estudos preparatórios, e pesquisas a respeito de como é a rotina de um estudante já na faculdade. Quem viveu isso foi a recém aprovada no curso de medicina, Maria Eduarda Donassolo, que iniciou sua vida acadêmica na primeira semana de agosto.
A estudante relata que seu estudo preparatório tomava cerca de 10 horas diárias, de segunda a sábado, e mesmo antes de ingressar na faculdade, o curso já a afetava mentalmente. Para ela, os momentos prévios aos vestibulares eram motivo de ansiedade, e sempre geravam um determinado desconforto emocional com a possibilidade da falha.
“Eu já tive casos de ansiedade durante a preparação, principalmente quando chegava perto dos períodos de vestibular. Era o medo da reprovação, de perder mais um ano de estudo e de decepcionar a família e os que torciam por mim. Acredito que todos os que estão estudando já tiveram pensamentos como esses”, relatou a universitária.
Maria Eduarda também buscou saber sobre a rotina universitária durante seu preparo. Ela relata que conversou com amigos acadêmicos, e também pesquisou através das redes sociais. Sua ideia era entender um pouco da rotina cansativa de um aluno de medicina, o cotidiano que a aguarda. Apesar disso, a aluna não se receou, e tem na possibilidade de conquistar seu sonho, sua principal motivação.
“Tive a oportunidade de conversar com alguns estudantes e entender a rotina deles, além disso eu sempre acompanhei estudantes de medicina pelas mídias sociais. Sei que são altos e baixos, e já ouvi vários relatos de pessoas que não conseguiram acompanhar o curso de forma saudável,e com isso, pude entender um pouco da realidade desgastante, porém, recompensadora deste curso”, explicou a estudante.
Quem já tem vivido esse processo é o aluno do quarto semestre de medicina na Unisalesiano, João Davi Baird, que é um dos muitos jovens que tiveram que sair de casa para estudar. O aluno se mudou de Campo Grande para Araçatuba, em São Paulo, e precisou aprender a lidar com a saudade constante de casa, da família e dos amigos, que vê apenas no período das férias – para ele, essa é a pior parte.
“Já faz quase dois anos que eu estudo, e o tempo de adaptação foi um pouco complicado, foram de seis a oito meses para eu me adaptar. Eu acho que a parte mais difícil é ficar longe das pessoas que você conhece, ficar longe do seu grupo de apoio original, porque eu fui pra lá sem conhecer ninguém, então eu não tinha ideia de quem recorrer se eu precisasse. É tudo muito novo, e eu acho que isso assusta”, disse Baird.
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Depois que chegou na faculdade, o estudante precisou se adaptar a sua nova vida, e conta que teve um início difícil. Ele desenvolveu um quadro de pânico e teve depressão durante algum período, e enxerga a faculdade não como um causador, mas como um agravante a sua situação.
O aluno hoje faz uso de remédios e já se consultou com psiquiatras para controlar algumas crises, mas relata que a universidade não apresentou ajuda, e não divulga programas de auxílio para a saúde mental de seus acadêmicos.
“Atualmente eu considero a minha saúde mental como estável, mas quando eu entrei na faculdade ela caiu bastante. Eu nunca vi a faculdade oferecendo diretamente, divulgando e fazendo projetos sobre o tema”, relata João.
Uma luz em meio ao túnel
Família e amigos: dois grupos que interligam João e Maria. Para eles, ter esse apoio, tem os ajudado a superar os momentos onde a dificuldade fala mais alto.
Para João, apesar da saudade, da falta de apoio universitário e dos receios, ele permanece firme em seu curso. O aluno conta que aquilo que o motiva é o fato de ter se encontrado em seu curso e estar feliz por poder viver a futura profissão. Baird também conta que fez poucas amizades, mas verdadeiras, e vê em seus amigos e no contato de casa, o apoio que precisa para seguir buscando seu sonho.
“Eu fiz bons amigos, e sei que posso contar sempre com eles. Isso é muito bom para poder desabafar, porque a gente entende o que estamos passando. E o que me motiva a continuar é por que eu me identifiquei, e me surpreendeu eu me identificar tanto com algo, porque eu gosto de pensar que eu vou poder ajudar as pessoas”, disse Baird.
Maria Eduarda também já passou por suas dificuldades, mas também tem pessoas a quem pode recorrer quando precisar. “Sempre tive abertura para conversar com a minha família e com meus amigos, então quando o meu psicológico se abala, eu posso recorrer aos meus pais e aos que me acompanharam nesse processo”.
Os estudantes passam por dificuldades, passam por pressões e passam por crises, e precisam de apoio durante esses momentos. Ser exposto a momentos de alta pressão ou momentos de solidão, enquanto precisam se empenhar na busca por seu sonho, afeta a mente de cada um, da sua maneira, mas em ambos os casos, o apoio, é a melhor solução.
“É importante se dizer que o sonho não precisa ser um sonho solitário. Um sonho que se sonha só, é só um sonho. Um sonho que se sonha junto, se torna realidade. Então é necessário dar suporte, e entender que ainda não se alcançou a finalidade dessa caminhada. E é por estarem alimentando o sonho mesmo com dificuldades que esses alunos e alunas necessitam de amparo, de uma voz amiga” concluiu o professor Ravanello.