Vereadores e servidores pedem mudanças na Junta Médica e humanização diante de queixas sobre readaptação

Troca de gestão na Junta Médica do Município de Campo Grande, cumprimento de legislações e atendimento mais humanizado foram os principais encaminhamentos de Audiência Pública, promovida na manhã desta sexta-feira na Câmara Municipal, para tratar das dificuldades enfrentadas pelos servidores públicos municipais readaptados. Durante o debate, foram apresentados vários relatos de desrespeito e falta de acolhimento com os profissionais que estão enfrentando problemas de saúde.

O debate foi presidido pelo vereador Valdir Gomes e secretariado pelo vereador Prof. Juari. A partir dos depoimentos de servidores, foram elaboradas as reivindicações à Prefeitura de Campo Grande, solicitando prazo de 15 dias para que as mudanças sejam implementadas. “Não podemos esperar mais. Trinta dias é muito tempo, pois estamos mexendo com vidas”, destacou o vereador Valdir Gomes.

A readaptação é a investidura do servidor em cargo de atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação que tenha sofrido em sua capacidade física ou mental, verificada em inspeção médica. Se a pessoa estiver com alguma deficiência que impossibilite de desenvolver a atividade que foi aprovada em concurso, poderá ser readaptada para outra função compatível.

O prazo de um mês para promover mudanças tinha sido apresentado pelo procurador Gilberto Porto, que compareceu ao debate representando a secretária municipal de Gestão, Maria das Graças. “Há um decreto de 2021 que estabeleceu regras para a Junta Médica, que precisa ser alterado”, afirmou.

Nos encaminhamentos, os vereadores e servidores solicitaram desvinculação da Junta Médica da Secretaria Municipal de Gestão, a troca da gestão da Junta Médica porque há necessidade de melhorar a humanização, incluir representação dos servidores na gerência da Junta, o cumprimento da legislação, em especial do que estabelece o Estatuto do Servidor Público Municipal.

Ainda, foi sugerido para que sejam definidas funções para readaptados, baseadas nos problemas físicos ou emocionais, para que todos possam continuar contribuindo no trabalho. Outro encaminhamento é para que os médicos integrantes da Junta justifiquem porque não homologaram a readaptação, contrariando os laudos médicos apresentados.

O vereador Valdir Gomes reclamou da ausência de representantes da Junta Médica e também da secretária de Gestão, cogitando a ida de um grupo ao Instituto Municipal de Previdência de Campo Grande (IMPCG) para pleitear as melhorias.

Alguns encaminhamentos listados na Audiência já tinham sido entregues à Secretaria de Gestão pelo Sindicato Campo-grandense dos Profissionais da Educação Pública (ACP), conforme o presidente Gilvano Kunzler Bronzoni. Neste ano, já foram feitas quatro reuniões com a Seges e duas com a Junta Médica, além de a ACP ter ingressado com ação judicial.

Bronzoni salientou a necessidade de uma política de humanização, para que os servidores não sejam tratados apenas como despesas. “A forma como tratamos a legislação municipal me envergonha. A readaptação é também não deixar servidor como inútil na unidade de trabalho. Ele está vivo, quer trabalhar, mas infelizmente está impossibilitado”, disse. Ele acrescentou que o tema é sensível para a ACP porque apenas nos últimos seis meses quatro colegas cometeram suicídio.

Dificuldades

Presidente da Comissão Permanente de Educação da Câmara, o vereador Prof. Juari salientou que se os servidores tivessem plano de carreiras decente, se o professor tivesse reconhecimento salarial, se tivesse o cumprimento da lei, e todos tratados como deveriam, não seria necessária Audiência. Ainda, ele questionou: “o que levou à readaptação? Será que o poder público faz essa pergunta? São condições de trabalho? Pressão? Assédio moral? São situações que levam o servidor a ser readaptado e são tratados, algumas vezes, como criminoso. Essa é a realidade”, destacou. Ele lembrou que muitos administrativos estão pedindo socorro, alguns dependendo de penduricalhos para ganharem acima do salário mínimo.

O vereador Tabosa, presidente do Sindicato Municipal dos Funcionários e Servidores Públicos Municipais, reclamou que muitos servidores são tratados de forma grosseira na Junta Médica. “O Executivo só movimenta se tiver reação forte das categorias envolvidas. Precisamos de concurso público e também que a Junta Médica respeite o servidor público”, disse.

O olhar mais atento à saúde mental foi evidenciado por Walkes Vargas, presidente Conselho Regional de Psicologia.  “Enxergamos a saúde como um todo, na nossa rotina, nosso cotidiano, alimentação, o trabalho a educação, o trânsito. Estamos falando de algo relacionado ao sofrimento humano, que não é identificado num exame de sangue. Imaginem o clima nas escolas com essas notícias de possíveis atentados”, disse. Ele lembrou da importância de tirar do papel a lei para assistentes sociais e psicólogos nas escolas.

O vereador Dr. Loester, integrante da Comissão de Saúde, falou do desafio para os médicos em integrarem a Junta e terem que avaliar as decisões de outros profissionais. “O profissional vê o cidadão pelo diagnóstico no atestado. Acredito que na primeira ida, o profissional concorda. Quando retorna, a análise é mais profunda. É a função dessa comissão”, disse. Ele ponderou, porém, que a Junta pode ser questionada se não está agindo como deveria, mas tem que respeitar o profissional.

Secretaria de Educação

O secretário municipal de Educação, Lucas Bitencourt, falou dos projetos desenvolvidos para acolher e amparar os profissionais da educação, a exemplo da coordenadoria Gente Cuidando de Gente e do Valorização da Vida. “Queremos contribuir para o readaptado, onde se sinta valorizado”, disse. No ano passado, foram 172 readaptações provisórias e 246 definitivas na educação.

Representando o Projeto Valorizando a Vida, Dayane Goeder destacou que em cada comunidade escolar é feito trabalho de prevenção. “Estamos recebendo alguns já adoecidos, que precisam do tratamento. Ele precisa passar pela Junta. A Semed nos favorece a trabalhar a saúde mental, mas precisamos que a Junta observe as potencialidades desse servidor. Muitas vezes, eles nos relatam um atendimento frio, desumano, sem acolhimento”, disse. A Semed também acompanhando individualmente a readaptação de cada servidor.

Depoimentos

A professora Eliane Lemos contou que está na readaptação provisória há seis anos. “Como se tem lei que em dois anos você entra na definitiva? Cadê a readaptação definitiva?”, questionou. Ela relatou problemas psiquiátricos e ortopédicos, em decorrência de artrose. Sobre a falta de humanização, disse ter ouvido de um médico que queria saber do trabalho dela e não da vida pessoal, quando relatou sobre o falecimento recente do marido.

A falta de critérios para que as readaptações não sejam homologadas foi questionada por Leonel Bonfim. “Os professores estão indo levar laudo onde consta tratamento, medicamento e a recomendação de readaptação porque não tem condições de voltar à função original, mas a resposta da perícia é padrão, Ctrl C, Ctlr V, para dizer que não homologa. Meu médico está pedindo para readaptar, não sou eu que quero”, afirmou.

A professora Larissa Trelha desabafou sobre o desrespeito ao ouvir que “é bonita, nova, tatuada e não pode ser doente”. Na sua opinião, os médicos tratam os profissionais como se fossem leigos, como se fosse depressão e ansiedade fossem frescura. “São vários casos. É um absurdo estarmos pedindo para trabalhar em paz”, disse.

Proposição – O debate na Câmara foi convocado pela Comissão de Saúde da Casa, tendo como proponente o vereador Prof. André Luis, que não pode comparecer em decorrência de problemas de saúde. No final de março, professores protestaram contra o processo de avaliação médica feito pelo IMPCG, depois da morte de um professor. Eles reclamaram que, mesmo com laudos médicos comprovando problemas de saúde mental, profissionais estão tendo de retornar à sala de aula. A Audiência foi proposta diante das várias reclamações sobre o tema para buscar soluções.

Milena Crestani
Assessoria de Imprensa da Câmara Municipal